Te vira, malandro!

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Um homem é aquilo que ele faz de si mesmo dentro dos limites fixados pelo destino herdado; ele é uma parte da humanidade. Seus atos não afetam somente a si mesmo, mas também a todo o universo.

Crowley, Aleister. Liber Librae, Sub Figura XXX

Eu estou só: não há deus onde Eu estou.

Crowley, Aleister. A Missa Gnóstica, Liber XV

O poder é de vocês!

Planeta, Capitão.

Thelemita adora dar uma de gostosão, não é mesmo? Mas também, o que se pode esperar de uma turminha que tem na cabeça um anúncio de neon dizendo “Faze o que tu queres”? Ou que lê um livrinho fino e já cola no peito um boton dizendo “REI!”? É, eu sei que isso é chato pacas. Diacho, eu mesmo não sei como é que eu me aturo!

Mas, descontando-se adolescências tardias tem aí uma coisa de certa. Thelemitas são deuses. Pena que eles esquecem que wiccans também são deuses. E cristãos. Até os crentes são deuses. Ou umbandistas, também são deuses. Ateus também. Aquela tribo de polinésios? Deuses. E você também é um deus. Ou deusa. Acho que já deu para entender, não é mesmo? Todo ser humano é uma divindade.

Vou contar uma historinha.

Houve uma vez em que eu estava bem no fundo do poço. Faltava grana, a vida amorosa não estava lá essas coisas. E nem me peça para falar da saúde. Aí eu fui a uma Missa Gnóstica. Fui com a firme convicção de jogar essa bodega toda para os deuses e eles que resolvessem para mim, que eu mesmo não estava dando conta. Assisti à Missa e fui fazer a comunhão. Enquanto comia o bolinho e tomava o meu gole de vinho fiz o que se pode chamar de uma oração, jogando a bola para o divino. Aí fui fazer uma saudação à sacerdotisa, erguendo a Taça. Era uma bela Taça, dourada e grande. Eu a ergui e olhei para cima. E sabem o que vi? Vi minha cara de pau refletida na Taça. Ali, no Útero do mundo, estava a minha cara. E eu vi que era a resposta dos deuses para mim: “te vira, a bola está contigo”!

Sabem, todo mundo conhece aquela parte da Bíblia onde o Deuzão rala que nem um doido para criar o mundo dentro do prazo, seguindo ali os procedimentos da firma. Aí, no finalzinho, cria a Humanidade “à sua imagem e semelhança”:

Você olha isso e pensa: “hmmm… aí tem”. E é isso mesmo.

Terminado o job, Deuzão resolve tirar uma folga, afinal, ninguém é de ferro. O que ele faz, então? Chega para a Humanidade e fala algo do tipo: “olha, vou dar uma descansada, mas você toma conta da lojinha”. E entrega as chaves da casa e a senha do computador para os estagiários. O pessoal que gosta da Bíblia ou do Pentateuco chama isso de “aquilo que aconteceu no sétimo dia”. Em termos simbólicos, um “dia”, não é um 9 to 5 ou um período de 24 horas. Está mais para uma fase de um processo maior. “Sétimo dia” está mais para “fase final do projeto”. Normalmente isso significa a entrega do projeto para o cliente e um monte de falhas sendo encontradas. E, no caso, é um projeto sem garantia.

Só que aí vai a bomba: o Sétimo Dia é agora e os estagiários somos nós!

É isso aí, amiguinhos. A Criação não acabou, não, ainda está em processo. E todo o poder de alterar o planejamento e os resultados está conosco. Somos nós que ficamos no lugar de Deus para resolver esse pepino. Que dureza, não?

Por outro lado, se nós somos a imagem e semelhança do projetista, se somos seus estagiários, isso significa que temos todos as mesmas capacidades dele. Só não sabemos lá muito bem como usar essas capacidades. E é isso que significa sermos deuses. Não é uma licença para sair fazendo o que der na telha mas uma responsabilidade em tocarmos esse projeto adiante, aprendendo como usar essas ferramentas até atingirmos nossa máxima capacidade.

Na boa, coloca um martelo e um serrote na mão de uma criança e veja só no que vai dar. Mas coloque essas mesmas ferramentas na mão de um marceneiro (sim, estou me atendo ao tema) e teremos mesas, cadeiras, armários etc. Entendeu como funciona?

Nossos atos repercutem no mundo que nos cerca, trazem mudanças. Quando feitos com consciência do plano que buscamos realizar (ops! alguém falou em Verdadeira Vontade?) essas mudanças vão se alinhar de forma positiva com outros atos, outras mudanças à nossa volta. E o mesmo vai acontecer com os atos de todos. Os meus, os seus, os da Tia Maricota… De todo mundo. Buscar essa harmonia dentro do grande plano que a todos envolve é o grande fito dessa caminho que tomamos.

Mas, uma coisa é verdade. Nem sempre temos saco para isso. Pombas, é um baita peso nas costas e tem horas que só queremos tomar umas caipirinhas e relaxar. E nessas horas é sempre muito tentador buscar um invertebrado gasoso barbudo para nos pegar no colo e um invertebrado gasoso chifrudo para culpar pelas groselhas que fizemos. Sim, ainda estou no tema.

Mas, o que se pode dizer além de… Não tem isso não!

Somos nós os responsáveis por nossos atos. E suas consequências serão sempre esse entrelaçamento entre o que fazemos e o que os outros fazem. Muitas vezes em resposta aos nossos atos. Outras sem relação direta. Mas, como tudo se conecta de uma forma ou de outra, vai nos impactar também.

E é por isso que não adianta ficar se achando aí todo divino ou divina, proclamar aos quatro ventos todo o seu poder, sua independência ou seja o que for, mas quando a porca torce o rabo ir chorar no colinho da sua divindade favorita.

ASSUME! Mata no peito a responsabilidade pela sua própria vida e lida com o que vier de fora! E com as consequências também. Isso é responsabilidade. Isso é magia. Isso é Thelema. Isso é a noção de que cada um de nós (espiritualmente falando, mas na prática também) tem de andar por seus próprios pés, mantendo-os firmemente plantados no chão, ainda que nossas cabeças estejam lá em cima, espiando anjinho tocar harpa.

Por isso se diz que Thelema é a Lei do forte. Não tem nada a ver com levantar peso ou dar uma de gostosão ou gostosona. É a força de olhar para si e ver uma divindade. Uma divindade plena de responsabilidade. Por si e por todo o resto.


Autor: Frater Hrw

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