A História de Thelema

Como surgiu Thelema e sua história no Brasil

Antecedentes

Ainda que o movimento Thelêmico atual trace suas origens ao trabalho de Aleister Crowley é importante conhecer os antecedentes do termo e suas formas de uso para uma pesquisa acurada.

A palavra θέλημα (thélema) é rara no grego clássico, onde "significa o desejo apetitoso, às vezes até sexual", mas é frequente na Septuaginta, a versão da Bíblia hebraica traduzida em etapas para o grego. Os primeiros escritos Cristãos, ocasionalmente, usam a palavra para referir-se à vontade humana, e mesmo à vontade do adversário de Deus, o Diabo. Geralmente, refere-se à vontade de Deus. Um exemplo bem conhecido é a oração do "Pai Nosso", do Evangelho segundo Mateus (6:10:): "Venha a nós o Vosso reino. Seja feita a tua vontade [Θελημα]. Assim na terra como no céu." Ela é usada de novo mais tarde no mesmo evangelho (Mt 26:42), "E, afastando-se de novo pela segunda vez, orou, dizendo: Pai meu, se este cálice não pode passar de mim sem eu o beber, faça–se a tua vontade." O filósofo e santo cristão Agostinho de Hipona, em seu sermão do Século V, deu uma instrução semelhante: "Ama e fazes o que tu queres." ("Dilige et quod vis fac").

No Renascimento, um personagem chamado "Thelemia", representava a vontade ou desejo na Hypnerotomachia Poliphili do monge Dominicano Francesco Colonna. O protagonista Poliphilo tem dois guias alegóricos, Logística (razão) e Thelemia (vontade ou desejo). Quando forçado a escolher, ele escolhe a realização sexual, sobre a lógica. O trabalho de Colonna foi uma grande influência sobre o monge Franciscano François Rabelais que, no século 16, usou Thélème, a forma francesa da palavra, como o nome de uma abadia fictícia em seus romances Gargântua e Pantagruel. A única regra da Abadia foi "fay çe que vouldras" ("Fais ce que tu veux", ou, "Faze o que tu queres"). Em meados do século 18, Sir Francis Dashwood escreveu o adágio em uma porta de entrada de sua abadia em Medmenham, o qual serviu como lema do Clube do Inferno. A Abadia de Thelema de Rabelais tem sido referida por escritores posteriores como Sir Walter Besant e James Rice, em seu romance Os Monges de Thelema (1878), e C. R. Ashbee em seu utópico romance A Construção de Thelema (1910).

A Escritura do Livro da Lei

Em abril de 1904, Aleister Crowley estava na cidade egípcia do Cairo, em lua de mel. Durante uma invocação às sílfides para diversão de sua esposa, Rose Keller, esta começa a receber o que identificou como mensagens de cunho espiritual, onde citava repetidamente o nome do deus Hórus. De início, Crowley não acreditou nela pois a considerava incapaz de tal coisa. Levando–a ao museu Boulaq de egiptologia, pediu a ela que indicasse quem era a divindade que estava entrando em contato com ela. No museu, Rose apontou para um estela funerária catalogada com o número 666, com o qual Crowley sentia uma identificação pessoal. Esta estela — hoje conhecida como Estela da Revelação — era consagrada ao sacerdote Ankh–af–na–khonsu e apresentava–o de frente ao deus Hórus, ambos abaixo do Sol Alado e da deusa Nuit. Sabendo que Rose não tinha conhecimento prévio sobre Hórus, Crowley passou a dar crédito a suas palavras e prepara–se para a comunicação que deveria receber.

Nos dias 8 a 10 de abril de 1904, na capital egípcia, Cairo, Crowley, escreve, sob a orientação do que ele descreve como uma entidade "preter humana", Aiwass, o Liber L vel Legis, chamado Livro da Lei. Posteriormente, o discípulo de Crowley, C. S. Jones, iria corrigir o título para Liber AL vel Legis, como é conhecido até hoje. 

De início, o próprio Crowley não aceitou o que escreveu no Livro e o guardou em um baú, esquecendo do manuscrito durante anos. Porém, após reencontrar as folhas que havia deixado de lado e relendo o que havia escrito, reconheceu o valor do que ali estava e, intitulando–se como Profeta da Nova Era, deu início ao trabalho de construção e divulgação do sistema de Thelema.

Organizações

A primeira Ordem a promulgar Thelema foi a Astrum Argentum (A∴A∴), organização iniciática fundada por Crowley para ocupar o lugar da finada Golden Dawn (Aurora Dourada), à qual ele havia pertencido. Quando assumiu a liderança da Ordo Templi Orientis, organização então de caráter maçônico, reformulou a Ordem para também seguir os princípios Thelêmicos, sendo, atualmente, a maior organização a trabalhar a Lei de Thelema, ainda que não a única.

Após a morte de Crowley, várias outras organizações vieram a surgir já no ou adaptar–se ao sistema Thelêmico, tais como o Colégio de Thelema, o Templo de Thelema, o Colégio de Thelema do Norte da Califórnia, a Santa Ordem de RaHoorKhuit, o Templo da Estrela de Prata, a Ordem Typhoniana, de Kenneth Grant, a Ordem dos Cavaleiros de Thelema ou a Ordem Thelêmica da Aurora Dourada. Outras organizações de orientação não exclusivamente Thelêmica mas que tem Thelema como parte importante de seu trabalho, seja como inspiração ou por utilização da metodologia, podem também ser mencionados, tais como os Iluminates of Thanateros (IOT) e o Templo de Set. Alguns outros grupos aceitam a Lei de Thelema mas omitem certos aspectos do sistema mágico de Crowley (Magick), enquanto incorporam os trabalhos de outros místicos e filósofos, além de outros sistemas religiosos. Dentre estes podemos citar a Fraternitas Saturnii (incorporando a ela o dito "Amor compassivo!"). Outra Ordem que utiliza a Lei de Thelema, ainda que não de forma integral, é a Fraternitas Rosacrucis Antiqua (F.R.A.).

Fora isso, Thelemitas podem ser encontrados em outras organizações não Thelêmicas como a A.M.O.R.C. e a Igreja de Todos os Mundos, cuja presidente, LaSara FireFox, além de vários outros membros, identificam-se como Thelemitas.

Thelema no Brasil

Há algumas controvérsias quanto aos primeiros indícios de Thelema em terras brasileiras. Alguns estudiosos apontam que Thelema teria chegado ao Brasil pelas mãos de Ida Hoffmann. Ida foi uma das fundadoras da histórica comunidade avant garde de Monte Verità, na Suíça, juntamente com seu marido, Henri Oedekoven. Esta comunidade recebeu influências Thelêmicas das mãos de Theodore Reuss, então líder da O.T.O. Para maiores detalhes, leia a História da Ordo Templi Orientis. Em 1920 ela mudou-se para o Brasil, estabelecendo uma colônia aos moldes do Monte Verità na cidade de Palmital, chamada Monte Sol. Porém, não há evidências mais do que circunstanciais de que se praticasse a filosofia de Thelema (menos ainda as práticas) em Monte Sol. No máximo, pode–se dizer que Thelema teve influência no trabalho de Ida Hoffmann e, portanto, no modo de pensar praticado em sua colônia brasileira.

Documentalmente, Thelema chega ao Brasil através da F.R.A., em 1933. Além de vários ritos calcados no pensamento Thelêmico, vários dos membros da Ordem identificavam–se como Thelemitas, e na revista da organização, "Gnose", foram publicados vários textos de Aleister Crowley (sempre identificado como Mestre Therion). Contudo, a F.R.A. nunca se preocupou em divulgar Thelema e jamais deu a entender ser uma Ordem Thelêmica. Thelema, assim, fica incipiente até que Marcelo Ramos Motta, um membro da A∴A∴, discípulo de Karl Germer, começa a traduzir textos de Crowley e divulgá-los abertamente. Juntamente com Raul Seixas e Paulo Coelho, escreve também músicas com temática Thelêmica que divulgam estes ideais na forma da Sociedade Alternativa de Raul. Após a tentativa frustrada de tomar o controle da O.T.O. em 1985, Motta cria sua Society O.T.O. que, apesar do nome, jamais teve qualquer tipo de ligação com a Ordo Templi Orientis. Após a morte de Motta, porém, o grupo foi perdendo atuação. 

Outros grupos a atuarem sob a égide Thelêmica no Brasil foram o Sagrado Círculo de Thelema — formado principalmente por membros da F.R.A. que desejavam a divulgação de Thelema no Brasil e que desenvolveram sua própria versão do Livro da Lei —, a Loja Nova Ísis, cujo trabalho baseava-se no de Keneth Grant, o Collegium ad Lux et Nox, grupo não iniciático voltado ao ensino de magia, e a Ordem Thelemita Brasileira, que alia Thelema à doutrina Rastafári.

Para um conhecimento da presença da O.T.O. no Brasil, leia o artigo A História da O.T.O. no Brasil.

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