O Poder da Visão Astral

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O que chamamos de visão astral é a capacidade de perceber imagens sutis surgidas além da concretude dos cinco sentidos, isto é, espíritos mensageiros de processos invisíveis. Essas Imagens nem sempre são visuais. São Imagens narrativas que podem também se comunicar através de sensações e intuições difíceis de explicar. Às vezes, as melhores metáforas são as mais simples, como a constatação de que “farejei algo” ou que “sopraram algo no meu ouvido”.

O sexto sentido capaz de personificar histórias ou personagens na nossa tela mental, ou de nos sugerir um dado sobre o ambiente em que estamos na forma de uma visão ou voz, não deve ser confundido com divagações de nossas fantasias, ou com o estado morno de consciência anestesiada no qual costuma viver quem não teve alguns despertares espirituais. As visões astrais têm uma presença peculiar – sua ocorrência intriga a percepção e parece mudar o ambiente –, baseiam-se numa atenção fina e possuem um corpo sutil tão delicado como o ar. Habitam o espaço que o misticismo islâmico chamou de hurqalya (terra celeste ou corporeidade celestial) e que Paracelso cunhou de imaginatio vera, a verdadeira imaginação, também conhecida como astrum in homine,  a criatividade da estrela interior do humano (Noel Cobb – Archetypal Imagination: Glimpses of the Gods in Life and Art).

Se abordadas com sofisticação e inteligência, visões astrais podem ser o retrato e termômetro da nossa vida interior, às vezes de forma mais pontual e objetiva que um sonho. Uma vez despertado o órgão sutil da visão astral, nosso processo de transformação tende a ser acelerado pela interação com suas Imagens.

O desenvolvimento da visão astral é o próprio objetivo de treinarmos viagens astrais. Essas viagens têm um espectro de gradações. Eu tento formular algumas dessas gradações, sabendo que para exercitar cada uma delas existem inúmeras técnicas disponíveis: 

  1. imaginação ativa, onde conscientemente meditamos parcialmente concentrados num símbolo ou sensação corporal, e parcialmente relaxados para as imagens espontâneas surgirem e se comunicarem conosco;
  2. tentar dialogar com essas Imagens a partir da contemplação sutil de dados ambientais cotidianos;
  3. sonhos lúcidos, onde nos relacionamos com as Imagens sem nosso corpo físico chamar nossa atenção;
  4. desdobramento, experimentado como se fosse o descolamento do corpo sutil de sua base material.   

Essas experiências são cores da mesma palheta que nos interessa: perceber dados daquilo que foi chamado de “luz astral”, a dimensão que nos cerca e que ondula como um lago diante de emoções, intenções e predisposições inconscientes. Perceber em algum nível essas correntezas astrais e antecipar o que ainda está para ser manifestado é uma das marcas de distinção de pessoas iniciadas. 

Isso conquistado, você ganhará preciosos aliados, companheiros e informantes de corpo sutil — a amizade com as Imagens é um dos segredos mais preciosos da alma! É prudente manter esse jardim secreto longe de olhos profanos. Psicologicamente, podemos pensar essa capacidade como o poder ampliado de simbolizar fatos do inconsciente. O que isso significa? Que o espaço entre o consciente e o inconsciente tem suas vias abertas para comunicações cada vez mais claras.

Independente de como você pense a natureza das Imagens — se “astrais” ou “do inconsciente” —, existe na prática com elas uma regra de ouro: nunca as literalize. Nunca as tome como verdade absoluta. Não confunda as dimensões! O idioma do mundo sutil não é o mesmo do mundo físico. Há um lento trabalho alquímico em perceber como essas dimensões dialogam, mas confundi-las é portal para o desastre.  

Trate as Imagens, portanto, com hospitalidade e respeito, mas tenha o mesmo escrutínio que você deve ter com pessoas de carne e osso que te comunicam a versão parcial de uma história. Sem esse cuidado, você vai tender à obsessão. Um efeito comum entre pessoas convencidas da literalidade de uma Imagem é o fanatismo, tentativa de converter o outro e empobrecimento existencial, pois a energia vital acaba raptada pela verdade parcial daquela Imagem específica.

Por exemplo: imagine que você fez uma prática de regressão de memória e se deparou com uma visão astral que lhe contou a história de que você foi numa vida passada uma pessoa terrível, que matou vários, destruiu a vida de centenas de famílias. Pior: imagine que você tenha se visto numa vida antiga como um antigo presidente da república que nada fez diante de uma pandemia e com isso foi responsável pela morte de milhares!

Bem, se você literalizar a visão, e supondo que esse conteúdo que descrevi seja algo aversivo para você, seu ego vai acabar se identificando com o enredo: você provavelmente vai ser tragado por ele e vai se sentir endividado e culpado. Mas se você maneja a visão de modo metafórico, como se ela estivesse comunicando algo simbólico, você pode dialogar de modo mais refinado com as Imagens sobre como elas se organizam na sua vida: como você lida com a ideia do mal e da destruição? Como lida com a culpa? Esse terrível presidente interior pode estar comunicando sobre uma insensibilidade sua? Como anda a sua capacidade de transformação, sua tolerância com seu próprio caminho e com erros do passado? 

Esse é um exemplo trivial que pode se aplicar para o diálogo com todo tipo de visão astral. Mantendo como norte o autoconhecimento, focamos no processo de aprendizado. Se literalizamos a mensagem das Imagens, acabamos fixados num lugar de pitonisas e profetas, podendo trazer verdades oraculares não solicitadas para a vida dos outros. O poder de ver o que os outros não estão vendo é uma realidade, mas como devolver isso à comunidade sempre vai nos inserir num dilema ético e pode ter preço caro na nossa vida pessoal. Cuidado com a fixação no complexo de Cassandra, a sacerdotisa troiana amaldiçoada com descrédito ao contar a verdade para ouvidos destreinados.

 A primeira atitude a se ter diante das Imagens é de receptividade. Escute-as, pergunte, interaja com elas. A curiosidade habitual de quem começa a ter visões astrais é própria ao arquétipo da criança: o interesse perguntador e descobridor de se aventurar num mundo novo. Comigo foi assim: perguntava muito, pedia explicações para as Imagens sobre elas mesmas a cada nova viagem astral. Esse desejo genuíno de aprofundar a experiência foi aos poucos cedendo espaço para uma atitude própria ao arquétipo da mãe: permitir-se ficar grávido das Imagens, perceber que em certo nível elas já são a própria explicação, um ritual vivo acontecendo no seu corpo sutil, que leva o tempo de uma gestação para manifestar transformação na sua vida prática. 

A próxima atitude a se ter diante das Imagens é o que Jung chamou de confronto ético: se não encarnássemos de algum modo a lição das Imagens como atitudes objetivas no mundo, elas seriam apenas um delírio estético, um delicioso turismo espiritual. 

Isso nos deixa a questão de como fazer isso. As requisições das Imagens são muitas vezes absurdas. Imagine por exemplo que uma visão astral ordene que você mate seus pais. O modo ético de aplicar essa lição é investigar que personagem é este que falou com você, se debruçar no que de seus pais poderia ser morto dentro de você e por fim mudar sua atitude a partir disso. Assim, as Imagens saem do mundo celestial e aterrissam no chão. Assim, nos tornamos nós mesmos uma ponte do céu com a terra – e não é essa união a Grande Obra? Pouco a pouco, as Imagens compõem o mosaico de uma Imagem maior: o desenho da órbita particular de nossa verdadeira vontade, o corpo do Santo Anjo Guardião.

Algumas pessoas têm mais facilidade para acessar as Imagens, outras não tanto. Eu acredito que isso se dê simplesmente por alguns ainda não terem praticado o suficiente e descoberto suas próprias chaves para acionar a visão astral de modo intencional. É questão de você encontrar o treino mais afinado com você. Mas é também importante reservar aqui alguma cautela, pois a relação com as Imagens pode despertar lembranças antigas e emoções profundas, afinal, a psique é experimentada por nós basicamente como sensação, emoção e imagem. Portanto, se as Imagens estiverem muito fortes e desestruturando demais o seu emocional, tente dar um tempo nas visões astrais. Se elas teimarem em te invadir, pratique outras coisas que aterrem. Para mim, fazer algo concreto como uma faxina em casa ajuda muito. Se lidar com as Imagens sempre for desestabilizante para você, não se frustre, pois existem outros meios que serão mais eficientes na sua jornada espiritual. Existem chaves apropriadas para a fechadura de cada um.

A partir desse ponto, eu só poderia te desejar aprendizados, sucesso e boas viagens.


Autor: Frater Bodhicitta

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