Faze o que tu queres será o todo da Lei.
Thelema pode ser vista tanto quanto uma religião, uma filosofia, uma proposta social ou a soma de tudo isso. É um sistema metafísico completo, que surge em 1904 através do recebimento do Liber AL vel Legis (o Livro da Lei) no Cairo pelo ocultista inglês Aleister Crowley. Esse livro proclama a chegada de um Novo Eon (Era) para a Humanidade. Nesse sistema, a suprema Lei é a chamada Lei de Thelema, sintetizada nos dizeres “Faze o que tu queres será o todo da Lei” e “Amor é a lei, amor sob vontade.” Estas palavras conclamam a todos ao autoconhecimento que lhes permitirá descobrir e realizar sua Verdadeira Vontade.
A aceitação e verdadeira compreensão desta Lei é o que define um Thelemita, para quem a descoberta e realização de sua Verdadeira Vontade é a maior motivação. Para tanto, Crowley deixou várias práticas e rituais que são chamados, coletivamente, de “Magick”.
Esta Vontade, por sua vez, não se trata de mero desejo. A Lei não pode ser interpretada como uma licença para realizar qualquer capricho e se eximir da responsabilidade. Ao contrário, ela se refere à estrita missão de descobrir e realizar sua verdadeira natureza, que equivale à divindade dentro de cada indivíduo. Em compensação, todos os direitos que não sejam a realização dessa Grande Obra não passam de ilusões.
Diferente do que muitos pensam, Thelema não prega o egoísmo, individualismo, libertinagem ou violência. Pelo contrário, é um caminho de evolução espiritual que busca realizar a totalidade do Ser Humano, promovendo a integração plena de corpo, mente e espírito através do trabalho interno. Logo, é um caminho de intensa disciplina e valorização tanto de si mesmo quanto do outro. O símbolo dessa disciplina e valorização é o deus egípcio Hórus, significando que vivemos em uma era (o Eon de Hórus) centrada no princípio da responsabilidade por si mesmo, por suas escolhas e seus atos, cuja fórmula é o crescimento da consciência e do Amor Universal (Ágape) que, através da Vontade (Thelema), leva à autorrealização.
Dentro do pensamento Thelêmico, entende–se que a razão deva ser uma ferramenta da Vontade e que a experiência é mais importante do que a teorização. A Vontade não se baseia em fé, mas sim na experiência direta do indivíduo em seu curso de vida. Thelema não é uma proposta baseada apenas na teoria, mas sim na vivência individual, na experimentação e no questionamento de ideias, sejam estas as com as quais discordamos, mas também as com as quais concordamos. Enquanto a fé se baseia na aceitação plena, a certeza de Thelema se firma sobre a experiência. Nenhuma experiência deve ser descartada a priori, mas adequadamente vivida e só então analisada à luz dos resultados desejados. Ao viver apenas a teoria da vida, a pessoa está, assim, privando–se do conhecimento de sua Vontade.
Uma vez que uma das principais características de Thelema é a completa ausência de dogmas, não existem verdades absolutas ou interpretações incontestáveis. São respeitados os conceitos religiosos, éticos, filosóficos ou sociais de cada pessoa, permitindo a todos sua interpretação própria do Livro da Lei e que cada uma seja não apenas válida mas também passível de experimentação.
De todo modo, como todos estamos em processo de autoconhecimento, conflitos internos e externos são normais. A ideia do “Faze o que tu queres será o todo da Lei” traz implicações éticas sérias, geralmente exploradas nos trabalhos de Crowley. Uma vez que se considera que uma pessoa não possua outro direito senão o de cumprir sua Verdadeira Vontade (AL III:60), descartando de seu caminho todos os desejos vãos e vontades passageiras menores, a única ação correta é aquela que provenha desta fonte, sendo qualquer outra considerada como uma distração indesejável à realização daquela.
Toda ação que afaste o Ser Humano do cumprimento desta Vontade é uma ação restritiva e, portanto, considerada “pecaminosa”. O “pecado” assume características relativas e não absolutas. O bem e o mal são circunstâncias adequadas a cada pessoa. Com isso, a autodisciplina e o autoconhecimento assumem importância capital: como todo Ser Humano tem potencial divino e é dotado de sua própria e soberana natureza, apenas através da disciplina e do conhecimento pleno de si mesmos e de si mesmas é possível exercer essa natureza de modo perfeito e harmônico, o que inclui não restringir a Vontade alheia, uma vez que o único crime do Universo é colisão entre estrelas. Essa é a completa liberdade, incluindo liberdade moral, sexual, política e filosófica, conforme compreendida por Thelema.
Como resultado, a maioria dos e das thelemitas e comunidades thelêmicas sérias promovem um ambiente de respeito mútuo, confiança e encorajamento de forma que cada pessoa descubra seu próprio caminho, evitando a presunção de que qualquer membro possa conhecer a Vontade do outro melhor do que ele ou ela mesmos.
É importante também compreender que a Lei de Thelema é o “Faze o que tu queres” e não o “faço o que eu quero”. Isso significa que ao proclamar-se thelemita a pessoa passa a conclamar não a sua própria liberdade e sim a liberdade do outro, dando à outra pessoa o pleno direito de ser quem ela é, mesmo que isso nos incomode. Thelema, assim, entende que a liberdade é uma questão universal: só podemos ser livres de fato quando essa liberdade nos é concedida por quem nós mesmos concedemos a liberdade.
A Lei de Thelema só pode ser consumada pelos esforços pessoais de cada um. De todo modo, muitos e muitas aspirantes têm um interesse genuíno por informação, assistência, companheirismo, oportunidade de troca de conhecimento com seus e suas colegas estudantes ou mesmo de servir à Humanidade. Esses e essas aspirantes são bem vindos à O.T.O.
Amor é a lei, amor sob vontade.