Faze o que tu queres será o todo da Lei.
Afinal de contas, o que temos? Temos nossos bens; casa, carro, roupas, móveis, nossa coleção de chaveiros. Basta olharmos à nossa volta e veremos um monte de coisas para as quais orgulhosamente podemos sorrir e dizer: “quanta coisa eu tenho”. Mesmo um miserável poderá ao menos tatear seu corpo caído no chão e saber que aquela carne e aqueles ossos lhe pertencem; são tudo o que ele tem mas ao menos ele tem algo. E o rapaz que acaba de sair da faculdade fica todo orgulhoso por aquilo que tem: seu conhecimento, sua mente privilegiada.
É tão fácil ter que normalmente nem paramos mais para pensar no quanto e no que temos de fato. E o que é que temos de fato, afinal?
Nossas posses, objetos, imóveis, jóias, carteira de notas… Tudo isso nos pode ser tirado a qualquer instante. Pode ser por um incêndio ou desabamento, podem nos roubar na rua. Podemos fazer algum lance errado na Bolsa de Valores e nos vermos, repentinamente, desprovidos de todo o nosso capital. Ou, de forma menos drástica, as coiasas podem cair no chão e quebrar pura e simplesmente. Então como podemos dizer que realmente temos esses bens materiais se a qualquer momento o destino pode nos privar delas? Se nos podem ser retiradas, na verdade, não as temos.
Mas que nem o mendigo acima referido, temos nossos corpos. Temos saúde para conquistar o mundo. Braços, pernas, olhos, boca… Tudo aquilo que, minuto a minuto vai se deteriorando rumo à implacável velhice. E aquela saúde que tínhamos, não a temos mais. E mesmo em nossa juventude não estamos plenamente protegidos de acidentes que nos podem paralizar ou mesmo nos privar de membros ou de algum dos sentidos. E temos ainda doenças, quando não somos nós mesmos a fazer besteira com nosso pobre corpo. Ou seja, esse envelope de carne que nos cerca também nos pode ser tirado. Ou melhor, nos é tirado constantemente pelo próprio tempo. Não, não temos nosso corpo, em verdade.
E quanto à nossa mente? Receptáculo fiel das memórias, dos conhecimentos. Criadora de idéias, receptora da intuição. Que, qual nosso corpo, é levada pelo envelhecimento. E ainda ajudamos o tempo, fazendo um monte de besteiras que avacalham a mente, mantendo-a fora de forma, desperdiçando-a a todo instante. E, ainda como o corpo, a mente nos pode ser levada por acidentes ou doenças. E todo aquele conhecimento, todas as memórias, todas as capacidades vão por água abaixo. Ou seja, também não temos nossa mente pois podemos perdê-la a qualquer momento.
Se não temos nada que possamos perder ou que nos possa ser tirado, então temos alguma coisa de fato? Ou será que o verbo “ter” é apenas uma falácia?
Tire tudo de alguém. Todos os bens, todos os confortos. Tire seu corpo, sua mente. O que sobra é tudo aquilo que realmente temos pois não nos pode ser tirado em hipótese alguma. Porém o que sobra não é apenas o que temos, é mais que isso: é o que somos. No fim das contas tudo o que temos é aquilo que somos, nossa essência divina, nossa Vontade. O único e verdadeiro ter é aquele que se confunde com o ser.
Isso quer dizer que devemos deixar de lado tudo o que “temos” de nos dedicarmos apenas e exclusivamente a uma incansável busca espiritual ou algo assim? Claro que não!
Isso significa que não devemos dar importância demasiada àquilo que por ventura possuamos. Se estamos de posse de alguma coisa, usufruamos daquilo o máximo possível, justamente por não o termos. Vamos morar em belas casas, andar em bons carros. Vamos comer boas comidas bebendo excelentes vinhos. Vamos dar e receber prazer com nossos corpo e vamos tirar o máximo proveito de nossas mentes. E tudo isso porque não temos nada. Vamos viver o máximo possível pois a própria vida a qualquer momento nos será tirada. E se amanhã não tivermos mais nada disso, o que importa? Nunca tivemos. Vamos dar um passo adiante e ver o que nos cairá nas mãos mais além. E vamos dar um jeito de fazer bom uso do nada também.
Basta lembrar que o que temos de fato é justamente o que faz de cada um de nós um deus e uma deusa.
Amor é a lei, amor sob vontade.